18.6.06

Szeretek Minden Sökét






















A língua húngara tem fama de ser o idioma do diabo. Dizem que a dificuldade em entendê-la vem da falta de parentesco com outras línguas mais conhecidas. Tremenda injustiça. Desde criança meus avós dominavam, não só o húngaro, como também o alemão e, de quebra e a contragosto, o romeno. Isso porque eram gente do campo. De pessoas com mais estudo como Paulo Ronai, as palavras fluiam não só nos idiomas oficiais do império austro-húngaro como também em inglês, francês e no português com que nos foi dado o prazer de conhecer Os Meninos da Rua Paulo. 

Para visitar a Hungria, não é preciso saber mais do que poucas palavras: csilag quer dizer estrela, ég é céu, bort é vinho, köszenem é obrigado e Isten é Deus. Pra que você precisa saber isso? Pra poder elevar as mãos ao ég e agradecer a Isten o privilégio de beber um bort Tokai numa noite cheia de csilags. 

Tokai é o vinho dos reis e o rei dos vinhos. O slogan, de qualidade duvidosa, é de autoria de Luís XIV, o afetado Rei Sol. E não foi apenas o absolutíssimo o único admirador famoso desse que alguns chamam de vinho de sobremesa e outros, mais apropriadamente, de vinho de meditação. Foi com uma taça de Tokai na mão que Rossini vislumbrou Guillermo Tell, Schubert compôs mais de 600 músicas e Goethe criou Fausto. 

Não é pouca coisa para o vinho que há mais de dez séculos encanta reis, rainhas, príncipes, princesas e, mais recentemente, plebeus que suam para investir quase 90 dólares em uma garrafa de Oremus Aszu 1999 5 puttonyos como a da foto. Para fazer este vinho, os vinicultores, pacientemente, esperaram que as vinhas passassem do ponto e fossem atacadas pelo fungo botrytis cinerea para então colher, manualmente, as uvas que já se encontravam em avançado estágio de maturação. O número de cestas, em húngaro puttonyos, utilizadas na fabricação do vinho varia de três a seis. É isso que determina a concentração do açúcar e, por tabela, do teor alcoólico. São os tais puttonyos que estão indicados lá no rótulo. 

O fato é que você não precisa de toda essa literatura para degustar um legítimo tokaji. Basta abrir a garrafa e deixar o pensamento fluir em direção ao ég e as csilags e, caso desfrute de uma boa companhia, deixe sair naturalmente um szeretlek: eu te amo. Se estiver sozinho, aproveite e grite: szeretem a szökét, que quer dizer amo as louras. Ou ainda, dependendo da quantidade de puttonyos que você tiver na cabeça, parta logo para um szeretek mindem sökét. Nada menos do que um amo todas as louras.


5 comentários:

CrissMyAss disse...

Szeretek Minden Posts!

Anônimo disse...

Apesar de morena, adorei o texto :)
Meus tios fabricam o vinho Alvarinho, em Pontevedra e todo este cerimonial podar as parreiras, sulfatar as uvas, depois colher as uvas e pisar nelas (sim, meus parentes ainda pisam) é coisa muito familiar pra mim. Ah sim, ia esquecendo, beber é ainda mais familiar. Vou procurar este vinho por aqui, nem que seja só pra olhar (preço nada convidativo hein...)

Adorei!

Vi disse...

Oi!!! Sou húngara e esbarrei no seu blog... Adorei o texto sore o Tokay!!! Abraços, Virág.

Pingas no Copo disse...

Caro Confrade, aprecio o seu estilo de escrita.
Possuo também um blog de vinhos que tenta fazer uma abordagem aos vinhos de uma forma diferente e algo parecida com a sua.

Do outro lado do Atlântico, em Portugal.

Paulo VIX disse...

Já tive o enorme prazer de beber um TOKAY OREMUS 6 puttonyos, a sensação em prová-lo, difícil descrever mas vou tentar. Parece tirar os seus pés do chão, seu corpo relaxa e sua mente se esvazia e você vai a outro mundo, por alguns minutos você se sente um REI!!!!!